sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Página 41



E finalmente quando deitei o meu corpo por completo na cama, eu pensei, liberando o ar do meu cérebro com rispidez. Fui consumido por vários pensamentos a me devorar, inclusive pensei sobre o ato de sofrer. Cheguei à conclusão de que eu nem sofrer sei, sabia? Tem-se que sofrer com a inteligência, a dor não pode tomar conta, ela não deve ditar as regras. A inteligência serve para que a dor só nos visite em casa uma, ou quem sabe, duas vezes no máximo. Sofrer demasiadamente é burrice e me afeta tanto saber disso porque não sou nenhum pouco inteligente. Eu nem sei sofrer, e isso me desconstrói. Eu queria ser trivial, milimetricamente trivial, e não ter o sofrer como vizinho.

Quero ser bicho solto na mata, quero pertencer ao meu habitat natural, quero ser prazer sem dor, como um viciado em cigarros baratos que traga todas as vezes o peso da fumaça mortífera em seu maior grau de prazer (morrendo e não se sentindo), seja ele momentâneo ou não. Quero ser o fumante e o próprio cigarro equilibrado na boca com graciosidade. Quero ser tragado até o último grau da morte em silêncio de prazer, e com o término, gozar da forma mais gratificante, faltando ar no corpo, sendo abandonado pela presença da voz, estando na cama deitado com a respiração longe e com os espermatozóides fincados dentro do outro.

Eu não sei quem eu sou e temo pungentemente que demore bastante tempo para eu descobri quem sou ou o que vem a ser eu. Eu só consigo saber quem eu queria ser e o estar sendo é um enigma tão desinteressante no momento para querer-se investigar a fundo que nem me dou ao trabalho de dedicar pensamentos a isso. Estar sendo é cor transparente, é água límpida e gelada que pode cortar a pele. Ter medo de ser é mais um para o meu repertório de medo. Estão todos guardados no fundo da minha gaveta, mas não estão trancafiados. O medo não é transparente, é furta cor.

Qual seria a minha cor por dentro, escura ou clara? Incolor? A dificuldade do incolor é que não se consegue pegar com as mãos, escorrega facilmente por entre os dedos, não é algo vivo.

Creio ter me equivocado no que acabei de falar. Creio que foi mais um engano já que minha mente tem trabalhado com dificuldade. Eu sou isso – mesmo não sabendo o que o isso significa ainda. Eu sou isso que sou e não sei fingir, então, sempre e sempre eu serei o isso que sou. Ser isso é inerente a mim mesmo. Devo sentir agora um grande alívio por saber que sou isso?

(ao som de ATAXIA - THE SIDES)

Um comentário:

A. Everton Rocha disse...

que página forte.
estremeci
continue
Resolvi não misturar os contos, resolvi continuar de um certo lugar agora são 11 páginas, melhor assim, mas tenho paciência.