terça-feira, 22 de junho de 2010

sina: Coracionalmente


Uma vez, numa de minhas crises, me falaram uma coisa que guardo até hoje: “ você não era “assim” antes  de amar tanto a literatura”. No momento, talvez, a pessoa tenha querido dizer outra coisa, ter trocado a “literatura” por outra palavra chave, talvez não tenha feito com medo de me magoar, mas eu senti que “palavra-chave” era essa, e digo mais talvez, talvez essa pessoa estivesse certa.

Estando certa ou não a frase ficou dentro de mim, ecoa até hoje, e desde então, sempre me questiono: a literatura me faz mal? Sei eu distinguir entre literatura e realidade? Essa intensidade que sinto, perante os sentimentos guardados em mim, é conseqüência das leituras que faço?

Sinceramente, ora creio que sim, ora que não. Ora sei bem separar as coisas, ora também não.

Bem, não é sobre literatura que quero falar-escrever aqui. Hoje, 22 de junho de 2010, como de muitas outras vezes, parei de respirar por um segundo: consequência: meu olhos estavam abertos. Meu peito comprimiu o meu coração, fez com que doesse como antes. Eu não sei mais o que fazer, até “ir embora” foi tentado, e nada resultou numa melhora. Estou doente da alma faz tempo, sou ser complicado que não sabe se contentar com a mediocridade. Sou um ser que carrega em si amor bruto. Sou tão amor que me imaginar não o sendo, penso logo no sacrifício que é para um cão não ter o seu rabo. Pois os cães expressam, bem mais, sua felicidade através do balançar do rabo.

- Nunca permitam que lhe cortem o rabo.

O meu já foi devidamente arrancado fora, sangra até hoje e não tem como por no lugar.

Estou cansado. Nem forças tenho mais e, ainda assim, penso que no dia seguinte estarei sã da alma de uma forma encantadora, onde poderei eu, viver livre. Mas só aspiro, pois no dia seguinte eu continuo com o peito apertado. Respiro pouco, ouço vozes e choro muito. Meu quarto, meu calvário. Não creio que um ser humano possa viver dessa forma, na qual tudo lateja e incomoda. Quando chega à noite, então... Ando de um lado para o outro no cubículo que chamo de quarto e é amedrontador. Quando isso acontece: meu peito dói, meus pés tremem, não possuem mais forças para sustentar o corpo, meus olhos caem, minha alma é perfurada com pequenos furos que deixam o ar escapar: eu morro. Tenho morrido todos os dias de 30, na esperança de que em apenas 1 eu viva ou reviva, mas não acontece nada.

Qual o sentindo de sentir tanto as coisas, meu Deus?

Não tenho mais forças. Preciso de raiva e de socos no estômago. Preciso ir embora de onde me encontro. Eu preciso parar de chover.

Talvez a literatura seja a culpada, em partes. Faz de conta que não existem monstros dentro de mim, faz de conta que durmo sossegado à noite, faz de conta que um dia será o bastante. Faz de conta que eu seja capaz de um dia ser salvo por méritos próprios.

Não consigo escrever-falar mais, tendo ou não culpa, a literatura me salva, tendo ou não culpa, todos os dias eu continuo o mesmo de sempre: morto em partes.

Faz de conta que o dia amanhã será azul e existirão sorrisos. Meu corpo não precisará mais tremer e meus olhos serão abertos.

2 comentários:

fernanda disse...

"Você não está mais na idade de sofrer
por essas coisas".

Há então a idade de sofrer e a de não sofrer
mais por essas coisas?

As coisas só deviam acontecer para fazer
sofrer na idade própria de sofrer?

Ou não se devia sofrer pelas coisas
que causam sofrimento pois vieram
fora de hora, e a hora é calma?

E se não estou mais na idade de sofrer
é porque estou morto, e morto é a idade
de não sentir as coisas, essas coisas?

[carlos drummond de andrade.essas coisas]

Cristiano Contreiras disse...

ah, O Livro dos prazeres de Lispector, me define!